terça-feira, 14 de agosto de 2007

O carteiro e o poeta

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Levava correspondências a Neruda
aquela alma nada calma
naquela boca muda
A tristeza da rede pescadora
do pai na alma dele
levava nele a sede
do que ainda não sabia
O pai pescador não ria
O pai pescador não via
o mar na alma da cria.

Enfim levava cartas a Neruda
e alguma palavra brotava
daquela boca miúda
alguma força raçuda
começou de leve como uma onda
a ocupar-lhe o nexo
Uma espécie de sexo
entre língua e dentes
nascia em poema
sob os olhos inocentes
Maior que a razão
era uma iniciação
feita a bicicletadas e ilhas
pernas vinco vínculo e coração.

Pra quem não conhecia metáforas
estava muito bem
como peixe que mordeu
a isca da poesia
e foi por ela salvo e morto
ao mesmo vento.

(Deus, que movimento, que acontecimento
que evento pode dar tanto esclarecimento
e poço a alma ao mesmo tempo?)

Levava correspondências a Neruda
e se correspondia
com sua alma nuda
seu perdiz:
A poesia
um poeta e uma Beatriz.

Bate onda forte, bate!
Circulatória. Cardíaca. Irreversível.
Baixem as armas
que o poeta recebeu as perguntas
as charadas
as respostas
as missivas

Baixem as armas
que o carteiro vive e agoniza certo.
Baixem as armas
que o carteiro provou do verso.


O carteiro e o poeta ~ Elisa Lucinda
Escrito em 5 de janeiro de 1996, incluído em Euteamo e suas estréias (editora Record, 2000).




e é isso moça bonita
nesta terça de tempo quente
e saudades mais quentes ainda



antoniOCarlos
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